Clarice nos ensina o que todos os verdadeiros mestres sabem e praticam, aprender com prazer.
Clarice Lispector era surpreendente em tudo, inclusive nos títulos que dava às suas obras. Exemplo é a curta (155 páginas) novela publicada pela primeira vez em 1969 e que se chama Uma Aprendizagem, ou O Livro dos Prazeres.
A esta descoberta Clarice denomina de “uma aprendizagem”. O que Lori precisa aprender? O que é que ela não sabe? Clarice responde: “Olhe para todos a seu redor e veja o que temos feito de nós. Não temos amado acima de todas as coisas. Não temos aceito o que não entendemos porque não queremos passar por tolos. Temos amontoado coisas e segurança por não termos um ao outro. Não temos nenhuma alegria que já não esteja catalogada. Falar no que realmente importa é considerado uma gafe”.
Este é o problema. E como se resolve? “Só poderia haver um encontro de seus mistérios se um se entregasse ao outro.” E conclui: “Aprendi que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer”. O que está nos dizendo Clarice?
Está enfatizando o valor da entrega, do amor como antídotos para a falsidade e a hipocrisia. “Não temos amado acima de todas as coisas.” O Primeiro Mandamento fala em “amar a Deus acima de todas as coisas”. Não só Deus, diz Clarice, amar a tudo e a todos, entregar-se; não adianta amontoar “coisas e segurança”, não adianta buscar alegrias catalogadas, estereotipadas.
É preciso falar no que realmente importa, por arriscado que seja. Apesar dos riscos, apesar dos obstáculos, apesar dos pesares, deve-se viver, deve-se comer, deve-se amar, deve-se morrer – morrer, sim; é parte da vida.É claro que o livro descreve uma aprendizagem. E é muito significativo que esta aprendizagem implique prazeres: o prazer da entrega, o prazer de amar, mas também o prazer da própria aprendizagem.